Leia e entenda a PEC 51 que quer desmilitarizar as PM’s

Muito se tem falado atualmente sobre a Proposta de Emenda à Constituição Número 51, que trata da remodelação completa da estrutura de segurança pública do Brasil, afetando todos os seus órgãos, sejam eles federais, estaduais ou municipais, além de criar uma nova estrutura burocrática chamada de Ouvidoria Geral. O foco da PEC 51 é, conforme descrito no seu preâmbulo, a desmilitarização das policiais militares do Brasil, o que representa a sua extinção, e da criação de órgãos ainda mais poderosos de fiscalização da atividade policial, com poderes praticamente ilimitados e subordinados ao poder político.

Essa proposta, tão controversa desde os seus princípios e objetivos, vem sendo defendida por pessoas e organizações que, por desconhecimento ou por interesses políticos e ideológicos, veem nessa PEC uma chance de melhorar a vida dos policiais brasileiros, no caso dos que desconhecem o seu teor real, ou, no segundo caso, de atingir os seus objetivos pessoais, muitos deles inconfessáveis.

Porém, o que mais preocupa nessa proposta radical não são as pessoas que sabem o que ela é e o que ela vai causar na vida de quase um milhão de policiais, bombeiros e guardas municipais, além da sociedade brasileira como um todo que depende desses órgãos para a sua segurança, mas de membros da sociedade e dos próprios órgãos afetados, como policiais e bombeiros, que defendem essa PEC 51 sem nunca terem lido a proposta com a devida atenção e entendendo plenamente o seu alcance e extensão.

Nesse artigo pretendemos esclarecer, o máximo possível, o que a PEC 51 diz textualmente e o que as palavras representam no mundo prático e as suas consequências nas vidas das pessoas envolvidas.

Para facilitar a leitura e entendimento dos comentários colocamos o texto original da PEC em vermelho e os nossos comentários em azul:

PROPOSTA DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO Nº 51

Altera os arts. 21, 24 e 144 da Constituição; acrescenta os arts. 143-A, 144-A e 144-B, reestrutura o modelo de segurança pública a partir da desmilitarização do modelo policial.

Aqui a primeira incongruência. A lei dá como ponto de partida a desmilitarização das polícias militares, como se a instituição por ser militar é, por si só, um demérito, o que, obviamente não é verdade. Existem dezenas de polícias militares no mundo, especialmente na Europa e América Latina, que funcionam normalmente. O problema da criminalidade no Brasil não é devido ao fato da principal força policial ser militar e sim pelas leis e procedimentos criminais que são lentos, burocráticos e caros e que visam a proteção dos direitos dos criminosos e não das pessoas de bem. Isso, aliado com a absoluta impunidade reinante no país, colocou o Brasil como campeão mundial de homicídios, com mais de 50 mil por ano (número de guerra civil). A preocupação do legislador deveria ser a diminuição da impunidade e da burocracia processual, além de melhorar a eficiência das ações investigativas policiais.

As Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, nos termos do § 3º do art. 60 da Constituição Federal, promulgam a seguinte Emenda ao texto constitucional:

Art. 1º O art. 21 da Constituição passa a vigorar acrescido dos seguintes incisos XXVI e XXVII; o inciso XVI do art. 24 passa a vigorar com a seguinte redação, acrescendo-se o inciso XVII:

“Art. 21……………………………………………………………………………………………

………………………………………………………………………………………………………………..

XXVI – estabelecer princípios e diretrizes para a segurança pública, inclusive quanto à produção de dados criminais e prisionais, à gestão do conhecimento e à formação dos profissionais, e para a criação e o funcionamento, nos órgãos de segurança pública, de mecanismos de participação social e promoção da transparência; e

XXVII – apoiar os Estados e municípios na provisão da segurança pública”.

Aqui as palavras chave são “conhecimento e à formação dos profissionais” e “para a criação e o funcionamento, nos órgãos de segurança pública, de mecanismos de participação social e promoção da transparência”. No caso de “conhecimento” o que a lei está prevendo, como será demonstrado mais adiante no texto, é a ingerência direta nas atividades de Estado da polícia, onde um ente externo político, no caso a Ouvidoria Geral (ou Super Corregedoria) que será explicado mais a adiante, poderá ter acesso aos dados sigilosos das investigações durante a sua realização. Quanto a “formação dos profissionais” é a centralização do governo federal dos currículos de formação das academias de polícia, onde os cursos e matérias serão impostos a partir de órgão externo estranho a corporação policial. Na segunda parte que versa sobre “transparência” e “participação social”, novamente, diz respeito a acesso de órgãos ou entes políticos a dados sigilosos das polícias, o que fatalmente causará o “vazamento” e a paralisação das atividades próprias de inteligência e investigação policial. Quanto a “participação social” trata-se apenas de um eufemismo para a atuação direta de pessoas ou órgãos externos dentro das atividades de rotina da polícia.

“Art. 24…………………………………………………………………………………………..

………………………………………………………………………………………………………………..

XVI – organização dos órgãos de segurança pública; e

A organização dos órgãos de segurança pública diz respeito a todos os órgãos de segurança pública do país que serão afetados pela PEC, no caso as Polícias Federal, Rodoviária Federal, Ferroviária Federal, Militares, civis, Bombeiros e Guardas Civis, ou seja, todos os policiais, bombeiros e Guardas do Brasil serão afetados pela PEC.

XVII – garantias, direitos e deveres dos servidores da segurança pública” (NR).

No caso a PEC só trata de deveres pelos servidores da segurança pública, ela praticamente não trata de direitos, sejam eles os já adquiridos por cada categoria, sejam os pleiteados para as futuras policias.

Art. 2º A Constituição passa a vigorar acrescida do seguinte art. 143-A, ao Capítulo III – Da Segurança Pública:

Aqui outra aberração: O uso de letras junto aos números dos artigos da Constituição, como no caso citado acima de 143-A. A fórmula é antiga e vem do código penal da União Soviética de 1926, que continha vários artigos seguidos de letras, como o famigerado artigo 58-1a, que dizimou uma parte da população sob o domínio soviético.

“CAPÍTULO III

DA SEGURANÇA PÚBLICA

Art. 143-A. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública democrática e para a garantia dos direitos dos cidadãos, inclusive a incolumidade das pessoas e do patrimônio, observados os seguintes princípios:

A redação original do artigo que está na Constituição hoje diz:

Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:

  1. – polícia federal;
  2. – polícia rodoviária federal;
  3. – polícia ferroviária federal;
  4. – polícias civis;
  5. – polícias militares e corpos de bombeiros militares.”

Na verdade a PEC 51 retira as polícias militares, civis e Bombeiros militares da Constituição.

I – atuação isonômica em relação a todos os cidadãos, inclusive quanto à distribuição espacial da provisão de segurança pública;

Como se as polícias do Brasil hoje não tratassem os cidadãos de maneira “isonômica”, o que é um princípio falso.

II – valorização de estratégias de prevenção do crime e da violência;

Como a proposta de lei não diz como isso será feito é apenas letra morta para encantar que lê.

III – valorização dos profissionais da segurança pública;

Como a proposta de lei não diz como isso será feito é apenas letra morta para encantar que lê.

IV – garantia de funcionamento de mecanismos controle social e de promoção da transparência; e

É a ingerência direta nas atividades de Estado da polícia, onde um ente externo político, no caso a Ouvidoria Geral (ou Super Corregedoria) que será explicado mais a adiante.

V – prevenção e fiscalização efetivas de abusos e ilícitos cometidos por profissionais de segurança pública.

É a primeira vez que uma proposta de lei parte do princípio que servidores públicos profissionais cometem abusos e ilícitos por natureza. É o princípio mais absurdo e injusto da PEC 51, que para justificar a ingerência externa política dentro da corporação policial, diz que os policiais são criminosos por essência, já que quem comete abusos e ilícitos (crimes) é criminoso.

Parágrafo único. A fim de prover segurança pública, o Estado deverá organizar polícias, órgãos de natureza civil, cuja função é garantir os direitos dos cidadãos, e que poderão recorrer ao uso comedido da força, segundo a proporcionalidade e a razoabilidade, devendo atuar ostensiva e preventivamente, investigando e realizando a persecução criminal”.

Novamente o que se vê é a inversão dos valores onde a polícia, não importa o modelo desde que não seja militar, deve recorrer ao uso “comedido de força, segundo a proporcionalidade e a razoabilidade”, como se os policiais brasileiros, hoje, não usassem esses princípios todos os dias, já que, ainda vivemos em um Estado democrático de direito, onde, pelo fato do Brasil ainda não ser um país totalitário, existem diversos mecanismos de controle e fiscalização dentro das policias, apurando e punindo os excessos. Na segunda parte diz que as novas corporações policiais farão o ciclo completo, ou seja, fazendo a ronda ostensiva e a parte de investigação e autuação criminal. A PEC, porém, não prevê em parte alguma a unificação das polícias militares e civis e sim a sua transformação em uma nova polícia cada uma, desmilitarizada e com atuação separada por espaço territorial e de autuação de crimes diferentes, como será demonstrado adiante.

Art. 3º O Art. 144 da Constituição passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 144. A segurança pública será provida, no âmbito da União, por meio dos seguintes órgãos, além daqueles previstos em lei:

I – polícia federal;

II – polícia rodoviária federal; e SF/13446.31391-07

III – polícia ferroviária federal.

Novamente fica claro que um dos objetivos da PEC 51 e a desconstitucionalização das policiais militares, civis e dos corpos de bombeiros.

§ 1º A polícia federal, instituída por lei como órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira única, destina-se a:

Aqui a grande tirada da PEC 51 e dos seus autores, a tal “carreira única” onde se acaba com as carreiras técnicas (praças e agentes) e de gestão (Oficiais e Delegados) passando a existir um concurso para provimento de vagas, iniciando pelo cargo técnico básico. Como se dará isso a PEC não diz, mas por analogia, deve-se implementar os moldes da Polícia Rodoviária Federal e de outros órgãos públicos e privados, como a Caixa Econômica Federal, onde o profissional faz o concurso que garante apenas o cargo inicial, sendo os demais cargos ocupados por indicação política, externa ou interna, e sua exoneração se dando da mesma forma. Por exemplo, um policial com 25 anos de polícia pode perder o seu cargo de chefia por ter contrariado algum interesse interno ou externo e ser substituído por um com 2 anos de polícia, que apesar de recém incorporado, tem alinhamento político. Isso, é claro, reflete-se na remuneração, onde o policial citado no caso acima perde mais 60% ou mais da sua remuneração ao voltar ao cargo inicial por perder o comissionamento, como ocorre hoje em qualquer secretaria ou ministério de governo federal, estadual ou municipal.

……………………………………………………………………………………………………….

§ 2º A polícia rodoviária federal, órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira única, destina-se, na forma da lei, ao patrulhamento ostensivo das rodovias federais.

O mesmo caso citado acima.

§ 3º A polícia ferroviária federal, órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira única, destina-se, na forma da lei, ao patrulhamento ostensivo das ferrovias federais.

O mesmo caso citado acima.

§ 4º A lei disciplinará a organização e o funcionamento dos órgãos responsáveis pela segurança pública, de maneira a garantir a eficiência de suas atividades.

Aqui é a previsão de que uma lei infraconstitucional regulará a organização e o funcionamento das polícias, deixando a corporação policial de ter a sua autonomia de gestão.

§ 5º A remuneração dos servidores policiais integrantes dos órgãos relacionados neste artigo e nos arts. 144-A e 144-B será fixada na forma do § 4º do art. 39.

Esse parágrafo quarto do artigo 39 da Constituição diz textualmente: “O membro de Poder, o detentor de mandato eletivo, os Ministros de Estado e os Secretários Estaduais e Municipais serão remunerados exclusivamente por subsídio fixado em parcela única, vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória, obedecido, em qualquer caso, o disposto no art. 37, X e XI.”

Ou seja, a remuneração das novas polícias passará a ser por subsídio, onde é “vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória” ou seja, para que haja ganho salarial por parte dos policiais a remuneração deverá ser alta momento da promulgação da PEC, já que uma série de vantagens pecuniárias são vedadas. Obviamente não é vedada o acréscimo salarial por cargo comissionado, conforme foi explicado acima.

§ 6º No exercício da atribuição prevista no art. 21, XXVI, a União deverá avaliar e autorizar o funcionamento e estabelecer parâmetros para instituições de ensino que realizem a formação de profissionais de segurança pública” (NR).

É a centralização do governo federal dos currículos de formação das academias de polícia, onde os cursos e matérias serão impostos a partir de órgão externo estranho a corporação policial e da autorização, por parte do governo federal, do funcionamento ou não das academias de polícia, além de “fiscalizar” se o currículo imposto está sendo executado e obedecido.

Art. 4º A Constituição passa a vigorar acrescida dos seguintes arts. 144-A e 144-B:

Aqui repete-se a aberração: O uso de letras junto aos números dos artigos da Constituição, como no caso citado acima de 144-A e 144-B, obedecendo a fórmula do código penal Soviético.

“Art. 144-A. A segurança pública será provida, no âmbito dos Estados e Distrito Federal e dos municípios, por meio de polícias e corpos de bombeiros.

Aqui trata-se de outra “inovação” da PEC 51, a criação de polícias e bombeiros municipais, substituindo as guardas municipais militarizadas e os corpos de bombeiros municipais voluntários.

§ 1º Todo órgão policial deverá se organizar em ciclo completo, responsabilizando-se cumulativamente pelas tarefas ostensivas, preventivas, investigativas e de persecução criminal.

Como dito acima, os órgãos policiais deverão fazer todo o ciclo policial, sendo ele ostensivo preventivo, investigativo e persecução criminal, contudo, como o Brasil passará de 57 polícias federais e estaduais para mais de 5.600 (cinco mil e seiscentas polícias) que terão a sua atuação dividida por tipos penais e de território nota-se que se criará o caos da gestão e aplicação dos recursos de segurança pública. O número acima foi calculado de maneira conservadora, somando-se o número de municípios mais os das polícias estaduais existentes e arredondando-se o número final para baixo. Contudo, o número de polícias pode chegar a quase o dobro disso, pois a PEC 51 autoriza a criação de mais de duas polícias estaduais (o DETRAN poderá ser uma polícia por exemplo) e de polícias submunicipais. A título de exemplo, no Distrito Federal, ao invés das duas polícias existentes, militar e civil, poderão ser criadas polícias para cada cidade satélite, no caso 31, além das forças atuais, totalizando 33 só no DF. Não é necessário ter muita imaginação para notar que a palavra caos não definirá totalmente a bagunça e a desorganização geradas pela aprovação dessa PEC.

Outro aspecto a ser considerado é a dos recursos públicos que dotam as polícias hoje. Obviamente, os recursos hoje divididos por duas polícias, terão que ser divididos em mais de 30, o que por si só já mostra que a tão esperada melhora salarial não virá como, com o tempo, sofrerá uma pressão para baixo. Não existe milagre da multiplicação do dinheiro pelo governo, funcionando como em uma casa com dois filhos que recebem 30 reais de mesada cada um. Caso o recurso, no caso 60 reais, tiverem que ser divididos por seis, cada um receberá só R$ 10. Simples assim.

§ 2º Todo órgão policial deverá se organizar por carreira única.

Isso já foi dito acima.

§ 3º Os Estados e o Distrito Federal terão autonomia para estruturar seus órgãos de segurança pública, inclusive quanto à definição da responsabilidade do município, observado o disposto nesta Constituição, podendo organizar suas polícias a partir da definição de responsabilidades sobre territórios ou sobre infrações penais.

Conforme explicado acima no parágrafo primeiro e nos comentários abaixo.

§ 4º Conforme o caso, as polícias estaduais, os corpos de bombeiros, as polícias metropolitanas e as polícias regionais subordinam-se aos Governadores dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios; as polícias municipais e as polícias submunicipais subordinam-se ao Prefeito do município.

Aqui a previsão de criação das várias polícias e bombeiros estaduais e municipais, conforme explicado acima.

§ 5º Aos corpos de bombeiros, além das atribuições definidas em lei, incumbe a execução de atividades de defesa civil”.

Mantem-se as missões de defesa civil dos Bombeiros sem dizer claramente qual será a estrutura depois da desmilitarização.

“Art. 144-B. O controle externo da atividade policial será exercido, paralelamente ao disposto no art. 129, VII, por meio de Ouvidoria Externa, constituída no âmbito de cada órgão policial previsto nos arts. 144 e 144-A, dotada de autonomia orçamentária e funcional, incumbida do controle da atuação do órgão policial e do cumprimento dos deveres funcionais de seus profissionais e das seguintes atribuições, além daquelas previstas em lei:

Aqui aparece a grande mudança da PEC 51: A criação da Ouvidoria Geral, que é um eufemismo para uma Super Corregedoria com poderes nunca imaginados no Brasil. Aqui o Caput da proposta do art. 144-B diz que “O controle externo da atividade policial será exercido, paralelamente ao disposto no art. 129, VII, por meio de Ouvidoria Externa”, ou seja, além do controle que já existe hoje e que continuará existindo, no caso, o controle externo da atividade policial prevista no art. 129, VII, será criada mais uma estrutura de fiscalização, a tal Ouvidoria Geral. Em seguida o texto da proposta de lei prossegue: “dotada de autonomia orçamentária e funcional, incumbida do controle da atuação do órgão policial e do cumprimento dos deveres funcionais de seus profissionais e das seguintes atribuições, além daquelas previstas em lei”, o que representa um órgão a parte da estrutura policial, sem vínculo nenhum e com orçamento próprio. Além de duplicar o custo da estrutura policial de novo e criar mais burocracia e cabide de cargos ela vai além, pois recebe pela proposta de lei o poder de “controle da atuação do órgão policial e do cumprimento dos deveres funcionais”, o que praticamente dá poderes ilimitados desse órgão sobre os policiais e a polícia. Mas não fica só por aqui, a coisa ainda piora, como poderá ser lido logo abaixo.

I – requisitar esclarecimentos do órgão policial e dos demais órgãos de segurança pública;

Aqui o poder de solicitar detalhes das atividades da polícia, sejam eles quais forem, como efetivo, armamento, treinamento, férias, serviço, além de investigados, inquéritos, etc. Acabando com o sigilo das investigações e de inteligência.

II – avaliar a atuação do órgão policial, propondo providências administrativas ou medidas necessárias ao aperfeiçoamento de suas atividades;

Outra ingerência, pois cabe a super corregedoria “avaliar”, sabe-se lá com que critérios, a atuação do órgão policial como um todo ou em ações específicas, além de propor medidas de “aperfeiçoamento”, ou seja, parte-se do princípio de os burocratas da super corregedoria tem um conhecimento absoluto da atividade policial e dos seus processos externos e internos e de que os policiais de carreira nada sabem, pois cabe a esse órgão externo avaliar e propor melhoras. Fica claro que, sendo aprovada a PEC, a quantidade de atritos entre esses órgãos e as polícias será brutal, além da quantidade absurda de burocracia que será gerada.

III – zelar pela integração e compartilhamento de informações entre os órgãos de segurança pública e pela ênfase no caráter preventivo da atividade policial;

Entende-se aqui um eufemismo para acesso as informações da polícia, sejam elas sigilosas ou não, além de estatísticas, de criminosos ou investigações, etc.

IV – suspender a prática, pelo órgão policial, de procedimentos comprovadamente incompatíveis com uma atuação humanizada e democrática dos órgãos policiais;

Outro ponto crucial da PEC 51: O poder da super corregedoria para parar atividades policiais, sejam elas administrativas, escolares ou de investigação. Dá pra imaginar que um determinado político que está sendo investigado terá todo o interesse do mundo que essa investigação seja declarada pela ouvidoria geral como um procedimento “não humanizado e democrático” e logo em seguida suspensa.

V – receber e conhecer das reclamações contra profissionais integrantes do órgão policial, sem prejuízo da competência disciplinar e correcional das instâncias internas, podendo aplicar sanções administrativas, inclusive a remoção, a disponibilidade ou a demissão do cargo, assegurada ampla defesa;

Aqui a super corregedoria externa atinge o seu ápice de poder, pois recebe da PEC 51 os poderes de receber reclamações, cabe ressaltar as palavras usadas no texto da proposta de lei: “RECLAMAÇÕES”, ou seja, não se trata somente de crimes ou transgressões disciplinares, mas apenas a palavra de uma pessoa que achou por bem reclamar contra profissionais do órgão policial. O texto da lei é tão ruim, de propósito é claro, que não diz que a reclamação deve ser por atos ou ações do policial, mas sim contra ele mesmo. Depois de “conhecer” a reclamação contra o profissional, a Ouvidoria pode aplicar sansões administrativas, como a remoção do cargo, comissionado ou não, suspender sem pagamento salarial (disponibilidade) ou demitir o policial. Sim, o absurdo dos absurdos aparece aqui com todas as letras: DEMITIR. Ou seja, um órgão fora da polícia recebe uma reclamação contra um policial, ela apura e ela aplica a sansão contra o policial, podendo inclusive demiti-lo. Não existe nada no mundo, a não ser em países totalitários e sanguinários como Cuba e Coréia do Norte, que chegue aos pés disso. Essa proposta acaba com autonomia policial no Brasil e transforma a atividade policial em meros burocratas escravos do poder político, sem nenhuma garantia mínima de carreira e permanência no órgão. 

A proposta de lei também deixa claro que a criação da Ouvidoria não extingue as corregedorias e ouvidorias internas de cada polícia, nem acaba com o núcleo externo de controle da atividade policial, sobrepondo vários órgãos de fiscalização sobre os mesmos policiais.

VI – representar ao Ministério Público, no caso de crime contra a administração pública ou de abuso de autoridade; e

Aqui a lei prevê que a Ouvidoria Geral (Super Corregedoria), além de aplicar as sanções previstas no inciso anterior, pode, ainda mandar o processo ao Ministério Público para que o policial seja processado criminalmente.

VII – elaborar anualmente relatório sobre a situação da segurança pública em sua região, a atuação do órgão policial de sua competência e dos demais órgãos de segurança pública, bem como sobre as atividades que desenvolver, incluindo as denúncias recebidas e as decisões proferidas.

Esse inciso VII trata da elaboração de relatórios estatísticos, que dentre outros, deve fazer uma relação de “eficiência” entre denúncias (ou como o inciso acima diz “reclamações”) e decisões proferidas (punições).

Parágrafo único. A Ouvidoria Externa será dirigida por Ouvidor-Geral, nomeado, entre cidadãos de reputação ilibada e notória atuação na área de segurança pública, não integrante de carreira policial, para mandato de 02 (dois) anos, vedada qualquer recondução, pelo Governador do Estado ou do Distrito Federal, ou pelo Prefeito do município, conforme o caso, a partir de consulta pública, garantida a participação da sociedade civil inclusive na apresentação de candidaturas, nos termos da lei”.

O parágrafo único faz, novamente, uma discriminação aberta, pois diz que o chefe da super corregedoria será qualquer um, pois “cidadãos de reputação ilibada e notória atuação na área de segurança pública”, na prática não diz absolutamente nada, já que são critérios subjetivos, ou seja, um advogado que luta pelos “direitos humanos de membros de facções criminosas” pode perfeitamente se enquadrar na definição vaga proposta acima. Pode ser qualquer um, exceto policial. É como se ser policial fosse um fato negativo em si mesmo, ou defeito ou fraqueza, que é impeditivo de preencher esse cargo, mesmo que o policial possua vários cursos e especializações e tenha escrito livros sobre o assunto, ele não pode assumir o cargo por ser policial. Trata-se, mais uma vez, como se viu nessa proposta de emenda constitucional do começo ao fim, de um preconceito absurdo e abjeto.

Para arrematar, o cargo pode ser preenchido mediante eleição. Dá pra imaginar um cargo desse, com tamanho poder, na mão de políticos, como os que fizeram essa PEC 51. Será o fim do pouco da segurança pública que ainda resta no Brasil.

Art. 5º Ficam preservados todos os direitos, inclusive aqueles de caráter remuneratório e previdenciário, dos profissionais de segurança pública, civis ou militares, integrantes dos órgãos de segurança pública objeto da presente Emenda à Constituição à época de sua promulgação.

Esse artigo é praticamente o único a tratar de algum direito já adquirido pelas categorias policiais brasileiras, tratando especificamente dos direitos previdenciários dos policiais. Contudo, o texto deixa claro que serão mantidos os direitos somente daqueles que já são policiais a época da promulgação da PEC 51. Ou seja, para os policiais que entrarem depois da promulgação da PEC será outra regra previdenciária, o que na prática, condena os policiais atuais pertencentes a regra antiga a se tornarem “carreira extinta” quando o último dos policiais atuais se aposentar, a exemplo do que ocorreu com os antigos funcionários da antiga Rede Ferroviária Federal. Após a extinção do órgão e depois de 30 anos com a carreira extinta e sem reajuste das aposentadorias, muitos dos funcionários aposentados, já idosos e doentes, morreram na miséria com aposentadorias que em muitos casos não somavam meio salário mínimo.

Art. 6º O município poderá, observado o disposto no art. 144-A da Constituição, converter sua guarda municipal, constituída até a data de promulgação da presente Emenda à Constituição, em polícia municipal, mediante ampla reestruturação e adequado processo de qualificação de seus profissionais, conforme parâmetros estabelecidos em lei.

Como foi dito no começo da análise da PEC, todos os órgãos de segurança pública do Brasil serão afetados, inclusive as guardas municipais. Aqui a lei diz que o município pode transformar a sua guarda em polícia municipal, desde que, monte uma academia conforme o determinado pelo Governo Federal e que monte um super corregedoria para fiscaliza-la. Com essas medidas o custo da estrutura segurança pública municipal vai mais que dobrar.

Art. 7º O Estado ou Distrito Federal poderá, na estruturação de que trata o § 3º do art. 144-A da Constituição, definir a responsabilidade das polícias:

Aqui a PEC diz claramente que os Estados e o Distrito Federal poderão definir a responsabilidade das polícias. A lei é clara quando diz policias no plural, pois em momento nenhum foi dito a palavra “unificação” das polícias militar e civil, ou seja, continuarão a existir duas polícias estaduais ou, além delas, serão criadas muitas outras, disputando poder e, é claro, a verba pública que permanecerá a mesma.

I – sobre o território, considerando a divisão de atribuições pelo conjunto do Estado, regiões metropolitanas, outras regiões do Estado, municípios ou áreas submunicipais; e

O que é proposto aqui diz que cada uma das polícias, estaduais, municipais e submunicipais, metropolitanas ou de região, terão atuação separada por território.

II – sobre grupos de infração penal, tais como infrações de menor potencial ofensivo ou crimes praticados por organizações criminosas, sendo vedada a repetição de infrações penais entre as polícias.

O que é proposto aqui diz que cada uma das polícias, estaduais, municipais e submunicipais, metropolitanas ou de região, terão atuação separada por tipo penal, como ocorre hoje com a Polícia Militar e Civil e que é vedado que uma polícia investigue ou combata um crime junto com a outra corporação. Resumindo, será a mesma dificuldade enfrentada pela PM hoje em dia multiplicada por cada nova polícia dentro do Estado ou município.

Art. 8º Os servidores integrantes dos órgãos que forem objeto da exigência de carreira única, prevista na presente Emenda à Constituição, poderão ingressar na referida carreira, mediante concurso interno de provas e títulos, na forma da lei.

Aqui o ouro de tolo da PEC 51 que levou tantos policiais a defende-la cegamente, literalmente, pois a grande maioria nunca leu a PEC. O que a proposta de lei diz é que os membros pertencentes as polícias PODERÃO entrar na carreira única mediante concurso interno de provas e títulos, na forma da lei. Que lei a PEC não diz, logo, deverá haver uma lei infraconstitucional regulamentando esse artigo, o que pode não ser feito nunca, como acontece com centenas de leis em vigor, ou se transformar em algo completamente diferente, com o provimento desse cargos ser feito por comissão, ou seja, por indicação política.

Art. 9º A União, os Estados e o Distrito Federal e os municípios terão o prazo de máximo de seis anos para implementar o disposto na presente Emenda à Constituição.

Uma alteração profunda e tão extensa como prevista na PEC 51, normalmente, deveria ser feita de maneira lenta e gradual, para não criar conflitos internos e externos dentro das corporações e na Sociedade. Mas não é o caso dessa PEC. Ela dá um prazo curto, de seis anos, para que todas polícias do Brasil se adaptem a ela em seis anos, o que, fatalmente, abrirá as portas ao caos, indisciplina, luta pelo poder dentro e fora das polícias e que praticamente vai paralisar o serviço policial durante anos.

Art. 10 Esta Emenda à Constituição entra em vigor na data de sua publicação.

De tudo o que foi exposto conclui-se que essa proposta de Emenda Constitucional, nada mais é do que uma armadilha para os policiais e para a sociedade brasileira, que já vive acuada por viver em um país com mais de 55 mil homicídio por ano, o que em 20 anos representa a perda de mais de um milhão e cem mil vidas, números de uma guerra civil, e que por isso almeja uma mudança naquilo que é fator de dissuasão nessa estatística mortal, no caso, o combate à impunidade. A PEC não trata disso, mas o seu objetivo visa a desmontagem do aparato policial brasileiro que tanto luta, com sangue e suor, para manter o Brasil de pé mesmo com leis e procedimentos processuais e penais que visam não a proteção das pessoas de bem, mas dos marginais, assassinos, assaltantes e estupradores que tanto infernizam a vida das pessoas de bem.

Além disso, a PEC não trata de remuneração ou fluxo de carreira, com tanto se vendeu e que tantos policiais compraram, mas sim, da desmontagem da estrutura policial sem colocar uma outra clara no lugar, além de partir do princípio que os policiais são criminosos por essência e que por isso é necessário criar uma super estrutura de corregedoria externa, sob o comando do poder político, para “fiscalizar” as polícias, podendo, inclusive, demitir o policial.

Outro mito dessa PEC é que ela unifica e simplifica o sistema policial brasileiro, o que além de não ser verdade, como foi demonstrado acima, quer fazer exatamente o oposto, ou seja, passar a estrutura policial de 57 polícias para milhares, o que, fatalmente, devido a limitação de verba para sustentar essa estrutura, refletirá nos salários e garantias de carreira para os policiais.

Vale ressaltar com todas as letras: ESSA PEC NÃO TRATA DE DIREITOS E MELHORIAS PARA OS POLICIAIS BRASILEIROS.

De tudo o exposto podemos concluir que essa PEC não pode ser aprovada em hipótese alguma, pois jogará a segurança pública do Brasil no caos e transformará a carreira policial num inferno de burocracia e perseguição política, além de enfraquecer os sistema policial ao limite da inutilidade. O Brasil se transformará no paraíso dos bandidos, mais do que é hoje, com resultados inimagináveis. Cabe a sociedade como um todo, aos políticos responsáveis e aos formadores de opinião em particular, além dos próprios policiais, a acordar do sono da morte e a trabalhar incessantemente para não deixar que essa PEC 51 seja o xeque-mate do Brasil.

Olavo Mendonça.

Fonte: ASOF.

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