Vale tudo na ideologia de gênero

Para destruir a lei natural dos corações humanos, nada melhor do que começar com a infância: quanto mais cedo as mentes humanas recebem as ideias, tanto mais elas se arraigam e mais difícil se torna tirá-las.

Este é, sem dúvida, um fato assustador, mas, de todas as cartilhas e livros produzidos para a instrução infanto-juvenil, praticamente nenhum material é capaz de tratar o tema “sexo” sem ofender o pudor das crianças ou desvirtuar a conduta moral dos jovens.

As apostilas distribuídas nas escolas e colégios do século XXI têm praticamente de tudo. Falam de como evitar uma DST ou uma gravidez – o que, na concepção antinatalista moderna, é quase a mesma coisa; ensinam a usar toda sorte de anticonceptivos; incentivam abertamente a prática da “masturbação”; e algumas chegam mesmo a ilustrar o ato sexual – isso quando não se recorre diretamente a materiais pornográficos para uma “aula experimental”. Criminosamente, porém, no meio de tudo isso, não se pronuncia uma palavra sequer a respeito da família. No sexo, vale tudo – exceto ter filhos. Ter sexo, de qualquer jeito – menos dentro da família. Parecem ser os lemas dos manuais produzidos pelos pedagogos e educadores contemporâneos.

Diferentemente do que muitos supõem, entretanto, nada disso é por acaso ou parte normal do “progresso” e “evolução” da sociedade. Métodos para alterar a moral sexual e remodelar o conceito de família fazem parte de uma estratégia meticulosamente traçada para manipular as consciências, reduzir o índice populacional e instaurar um governo totalitário no mundo inteiro. Para atingir tal objetivo, nada melhor do que começar com a infância [1]: assim como a cera mole pode ganhar qualquer forma que se queira imprimir-lhe, quanto mais cedo as mentes humanas recebem as ideias, tanto mais elas se arraigam e mais difícil se torna tirá-las.

É isso o que explica, por exemplo, os pedidos frenéticos de “especialistas” por uma “escola em tempo integral”. A meta é tirar as crianças do seio familiar e transferir ao Estado a responsabilidade de educá-las – algo que o governo brasileiro cunhou sob a expressão sintomática de “Pátria Educadora”. Esse projeto corresponde perfeitamente aos anseios do filósofo alemão Friedrich Engels, o qual pedia, ainda no século XIX, que a educação das crianças se tornasse “um assunto público” [2]. O comentário da feminista Kate Millett a esse respeito é revelador:

“A partir do momento em que se manifestam os primeiros poderes cognitivos da criança, seria preferível confiá-la a profissionais de ambos os sexos, que se dedicam a essa tarefa por vocação, do que deixá-la ao cuidado de pessoas preocupadas e por vezes infelizes, com pouco tempo e gosto para lhe educar o espírito. A tese radical da análise de Engels é a de que a família, tal como é hoje encarada, deve desaparecer.” [3]

Neste ponto, mais do que acusar os engenheiros sociais de sequestrar as futuras gerações e torná-las reféns de um projeto educacional absolutamente arbitrário, também seria necessário fazer um alerta aos pais. Quando muitos deles têm “pouco tempo ou gosto” para educar as crianças que eles mesmos trouxeram ao mundo – sendo, na maioria das vezes, os primeiros a engrossar os pedidos por “escolas integrais” –, o que se pode dizer, senão que eles estão deliberadamente vendendo os próprios filhos ao Estado? Sem corrigir as coisas dentro de casa – devolvendo às famílias a sua “vocação natural” de “educar os filhos” –, dificilmente se pode mudar o atual estado das coisas.

“Gênero” nas escolas

Outro exemplo de como a infância é o alvo principal dos gurus da “nova era” são os recentes debates sobre a teoria de gênero, que as prefeituras municipais têm conseguido barrar com sucesso de seus planos de educação. Apesar da aparente vitória da família brasileira nessa matéria, os ideólogos estão dispostos a tudo para levar a cabo os seus planos sórdidos – ainda que isso signifique derrubar a própria base democrática das instituições brasileiras.

Os pais não querem o “gênero” nas escolas? Não faz mal, diz a filósofa e psicanalista Viviane Mosé. “Quem dá aula é o professor”, ela afirma. “Nós não precisamos de que os vereadores decidam isso, nem nos intimidar com o que os vereadores decidem, nem esperar que os vereadores decidam, (…) eles não dizem respeito a nós. (…) Questão de gênero não precisa ter este nome em nenhum lugar para que seja discutida.”

As famílias são contra doutrinação ideológica nos colégios? Não faz mal, disse o sociólogo Richard Miskolci, durante o I Seminário Queer, realizado recentemente em São Paulo. Segundo ele, a exclusão do termo “gênero” dos PMEs não impedirá que os professores abordem o tema. “A forma geral de condução da educação exige o respeito aos direitos humanos. Isso não foi tirado dos planos e, portanto, essas discussões ocorrerão na sala de aula”.

Em resumo, os chamados “especialistas” já se sentem os responsáveis pela educação das crianças. Pouco importa que os pais sejam a favor ou contra a ideologia de gênero; que eles tenham lotado as câmaras legislativas do Brasil para protestar contra essa teoria perversa. Os “especialistas” acham que sabem o que é melhor para os nossos filhos e vão colocar a matéria dentro das salas de aula, queiram ou não as famílias. Se isso já não é uma espécie de totalitarismo, estamos bem próximos de chegar lá.
A falsa propaganda de Judith Butler

Também a filósofa Judith Butler, que estava no Brasil, disse durante coletiva de imprensa, em tom de desdém, que a exclusão do termo “gênero” dos PMEs “não é o fim da história”. Na sequência da discussão, diz ela, “haverá ativistas, haverá educadores, haverá organizações internacionais” – todas prontas para tornar o tema “altamente debatível” entre as crianças.

Mas, atentem-se para a astúcia da pensadora norte-americana. Tirando o foco dos conflitos em torno do assunto, ela diz que não vê nada disso como um “debate”, mas como “algo com que nós lidamos o tempo todo”, e explica:

“Como você vive o seu corpo sexuado no mundo (…) é algo que as pessoas vivem todos os dias, quando perguntam: Que tipo de mulher eu quero ser? Com isso, pressupõe-se que você pode, em algum grau, participar na construção do seu gênero. Que tipo de homem eu quero ser? Quero ser um homem que violenta as mulheres e as mata? Não, eu não quero. Certo, isso significa que você acha que seu gênero pode ser remodelado de uma maneira ética. Isso significa que a categoria de homem está sendo refeita para o debate público. Isso é bom.”

Ora, quem pode ser a favor da violência e do assassinato de mulheres, não é mesmo? Ninguém! O problema é que o discurso de Butler não passa de falsa propaganda para vender a sua ideologia.

Que as pessoas devem mudar o seu comportamento; que devem se esforçar por ser justas e virtuosas, é coisa que a moral cristã já ensina há dois mil anos. Que os seres humanos devem se respeitar; que matar o próximo é um crime hediondo e reprovável em todos os tempos e lugares, é lição que todo pai de família minimamente honesto deveria passar aos seus filhos.

Para ensinar ética, não é preciso inventar novas teorias filosóficas ou categorias psicológicas mirabolantes. Para formar os indivíduos, não é necessário dizer, por exemplo, que “homem e mulher podem facilmente significar tanto um corpo feminino como um corpo masculino, e mulher e feminino podem significar tanto um corpo masculino como um corpo feminino” [4], como escreve Butler, em seu livro Problemas de Gênero – o qual foi reeditado pela editora Civilização Brasileira, no mês de agosto. Sem máscaras ou disfarces, o que realmente intenta a teoria de gênero é subverter a sexualidade e remodelar o próprio ser humano. Ninguém precisa dessa ideologia fajuta para aprender o amor e o respeito ao próximo.

Destruir a lei natural

A pergunta que sempre vem a calhar é: como os ideólogos de gênero vão remodelar o ser humano, se está inscrita na sua própria natureza a distinção entre os sexos masculino e feminino? Pode aquilo que os pensadores antigos reconheceram como a “lei natural” ser abolida do coração humano?

Para Santo Tomás de Aquino, os princípios naturais mais comuns jamais poderão ser apagados da humanidade como um todo. Com relação a preceitos mais secundários, porém, ele admite que “a lei natural pode ser deletada dos corações dos homens, seja por causa de más persuasões, assim como, nas ciências especulativas, ocorrem erros acerca das conclusões necessárias; seja também por causa de costumes depravados e hábitos corruptos, como aqueles que não consideravam pecado nem o roubo, nem os vícios contra a natureza (cf. Rm 1, 24s).” [5]

Para os teóricos do gênero, porém, não há natureza e, ainda que ela existisse, não constituiria nenhum empecilho para a “revolução” já em curso. É o que admite a feminista Shulamith Firestone, em seu livro A Dialética do Sexo:

“O ‘natural’ não é necessariamente um valor ‘humano’. A humanidade já começou a transcender a natureza: nós não podemos mais justificar a manutenção de um sistema discriminatório de classes sexuais com base em suas origens na natureza. Na verdade, por simples razões pragmáticas, começa a parecer que nós devemos nos livrar dela.” [6]

Para implantar a sua utópica sociedade andrógina – na qual “as diferenças genitais entre os seres humanos não mais importariam culturalmente” [7] –, essas pensadoras estão dispostas a abolir não só a religião, mas a própria lei natural dos corações humanos. Não há verdade de nenhum tipo que as limite: apenas a sua vontade, e nada mais.

Como responder a essa ideologia perversa? A solução está dentro das famílias, nas escolhas que os homens e mulheres de nosso tempo fizerem para esta e para as futuras gerações. Seremos capazes de sacrificar o nosso egoísmo e as nossas comodidades para viver o casamento cristão e educar os nossos filhos? Estamos dispostos a dizer “sim” ao maravilhoso projeto de Deus para o ser humano?

Corruptio optimi pessima, diz um adágio latino. Nenhuma matilha de cachorros é tão desordenada e violenta quanto um bando de pessoas afundadas nos vícios – e das quais foi abolida a própria verdade natural das coisas. Assim é, porque o ser humano, “a criatura mais nobre que Deus colocou sobre a terra” [8], foi chamado às alturas do Céu. Quando ele cai, a sua queda é a pior de todas: desce até as profundezas do inferno.

De que cidade queremos ser cidadãos? Para qual delas queremos mandar os nossos filhos? Eis a pergunta que devem responder os pais brasileiros, todos os dias, na intimidade de seu lar. Seja nosso modelo a santa família de Nazaré.

Por Equipe Christo Nihil Praeponere.

Referências:

Cf. Platão, A República, II, 377b.
ENGELS, Friedrich. A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado (trad. Leandro Konder). 9. ed. Civilização Brasileira: Rio de Janeiro, 1984, p. 82.
MILLETT, Kate. Política Sexual (trad. Alice Sampaio, Gisela da Conceição e Manuela Torres). Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1974, p. 100.
BUTLER, Judith. Gender Trouble: Feminism and the Subversion of Identity. Routledge: New York and London, 1999, p. 10.
Suma Teológica, I, II, q. 94, a. 6.
FIRESTONE, Shulamith. The Dialectic of Sex: the Case for Feminist Revolution. Farrar, Straus and Giroux: New York, 2003, p. 10.
FIRESTONE, op. cit., p. 10.
Catecismo de São Pio X, n. 48.

 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.