Pangarés do mundo, pedalai-vos!

O principal jornal da Capital Federal foi enviado para a casa dos assinantes, na sua edição de domingo, em um envelope com o chamamento para a campanha “Dia mundial sem carro”. No envelope, que foi produzido em uma agência de publicidade, estavam estampados lado a lado as marcas do governo federal e do Governo do Distrito Federal, ambos do mesmo partido.

Contudo, o que mais chamou a atenção é que essa campanha, planejada, montada e divulgada com dinheiro público, conclama as pessoas que possuem carro a deixa-lo em casa e a usarem bicicletas, não para recreação como é praticado hoje, mas como o seu meio principal de transporte.

Parece absolutamente inacreditável que o Governo Federal e Distrital gastem uma fortuna em uma campanha para que as pessoas que trabalham, tem que fazer toda a sorte de afazeres como compras e deixar crianças na escola, tenham que parar de usar os seus carros para irem ao trabalho ou para a faculdade pedalando.

O argumento, é claro, é que o carro é um meio de transporte egoísta, que só leva uma pessoa, o que é antissocialista, pois todos temos que usar o transporte coletivo; Outro argumento é que o carro “polui” e que por isso, para salvar a “mãe gaia terra” temos que abdicar de hábitos de consumo prejudiciais a flora, a fauna e aos paquidermes carentes.

Porém, o que o periódico e os seus patrocinadores governamentais esqueceram de comentar é o porquê que o mesmo governo que dá tantos incentivos a indústria automotiva, considerada como um dos únicos fatores de desenvolvimento econômico real do Brasil, como a redução do imposto de produtos industrializados, IPI, vem agora, depois do carro comprado, com prestações a perder de vista e com os juros mais altos e criminosos do mundo, exige, depois, que ele seja deixado na garagem? Logo agora que o carro já foi fabricado e que a parte mais poluente já foi feita? Lembrando que não tem comparação os níveis de emissão de CO2 dos ônibus e dos carros, sendo os dos ônibus dezenas de vezes mais tóxicos, isso em uma cidade civilizada onde os ônibus são novos e passam por revisões periódicas. Aqui em Brasília é comum ver ônibus velhos soltando uma quantidade de fumaça negra tão grande que os faz parecer velhas locomotivas a carvão do Século XIX.

Quanto ao uso da bicicleta para deslocamentos funcionais, como ir ao trabalho, ela só é eficiente em cidades onde esse deslocamento é curto e que existe uma série de obras públicas para que seja praticável, como ciclovias, estacionamentos para bicicletas, estruturas para se tomar banho ao chegar ao trabalho e segurança, o que não é o caso do DF.

Para começar que somente 10% dos moradores do Distrito Federal moram no Plano Piloto, o que faz com que o restante da população tenha que se deslocar mais de 20 quilômetros em média para se chegar ao trabalho. Nem é preciso comentar que não existem ciclovias, nem mesmo no Plano Piloto, estacionamentos para as bicicletas e muito menos estrutura para banho nas repartições e empresas. Fora que o risco de assaltos é imenso, pois não existe policiamento voltado para essa atividade.

Interessante foi notar que o mesmo jornal publicou várias reportagens sobre a Operação Esopo, desencadeada pela Polícia Federal e que desbaratou uma quadrilha de desvio de dinheiro público no Ministério do Trabalho, onde a marca da operação foi a apreensão de vários carros de luxo comprados por um dos investigados, que é ligado ao PDT e assessor no Ministério.

carro corrptos
Envolvido em escândalo de corrupção no seu carrão conversível. O povo tem que andar é de bicicleta.

O que ficou claro nesse episódio é que o Governo Federal e o Distrital querem que as pessoas comprem carros caríssimos, financiados com as taxas de juros mais altas do mundo para que a economia gire e que o governo continue se enchendo com o dinheiro dos impostos.

Só que depois que as pessoas compram os carros é necessário investir pesado em obras de engenharia de tráfego como viadutos, duplicações, vias expressas, etc. Ou teria que se investir maciçamente em transporte público de qualidade, expandindo as linhas do metrô e obrigando as empresas de ônibus a fazer valer o preço da passagem com carros novos, tecnologicamente avançados para oferecer Wi-Fi e outros recursos.

Mas fazer isso, além de dar um trabalho danado, tem que ter competência e boa-fé para que o objetivo do Estado seja alcançado, mas não é o caso. O que se vê é que é muito mais fácil e barato para o governo encomendar uma campanha de publicidade, pagar para publica-la nos órgãos de imprensa, incentivando as pessoas a andarem de bicicleta por mais de 20 quilômetros em um sol escaldante, com risco de serem atropeladas ou assaltadas e de passarem o dia suadas no trabalho.

Afinal, no Brasil é assim, todo mundo fica feliz com uma ideia de pangaré: O governo que não tem que gastar em melhorias de mobilidade urbana que é a sua obrigação, as agências de publicidade e os jornais que enchem os bolsos de dinheiro público e os políticos corruptos que podem passear com os seus carrões conversíveis importados pelas ruas de Brasília sem os malditos engarrafamentos causados pela rés-plebe de carro financiado.

Olavo Mendonça.

Fonte das fotos: G1

Reportagens sobre os fatos citados no artigo: G1, R7, O Globo, O Globo, correioweb, Ministério do Planejamento.

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