NINGUÉM SE LEMBRA DE TATIANA

A policial negra assassinada por bandidos na Grande São Paulo e ignorada pela esquerda

FONTE: JORNAL BSM

POR: PAULO BRIGUET

Na semana passada, uma notícia passou quase despercebida pela grande mídia brasileira. Uma mulher negra, trabalhadora, mãe de 3 filhos, foi assassinada na frente de sua casa no bairro do Taboão em Guarulhos, município da Grande São Paulo. Tatiana Regina Reis da Silva era soldado do 2º Batalhão de Choque da Polícia Militar e tinha 36 anos. Seu velório foi acompanhado com grande comoção pela comunidade local, mas resultou em matérias com não mais de 2 minutos nos telejornais da grande mídia.

No momento do crime, Tatiana estava de folga e conversava com um mecânico que havia ido entregar o carro da policial. Pelas câmeras de segurança, é possível ver o momento em que dois homens se aproximam e apontam suas armas contra ela. A policial saca sua arma, atira nos bandidos e se refugia com o mecânico atrás do carro. Ela foi atingida por dois tiros, no abdômen e no peito. Levada para o hospital em Guarulhos, não resistiu aos ferimentos.

Um dos assassinos de Tatiana foi preso ao dar entrada em um pronto socorro, com um ferimento de bala na perna. Graças às nossas magníficas leis, não podemos dizer o nome desse bandido aqui, porque ele tem 15 anos e não atingiu a maioridade penal. Pouco antes do crime, esse cara havia sido “apreendido” por furtar um carro, mas ganhou a liberdade para voltar a cometer crimes. Detalhe: o bandido possui uma tatuagem com a figura de um palhaço ― que identifica entre os bandidos o assassino de policiais, garantindo-lhes regalias e respeito na prisão. Matar policiais, para esses facínoras, representa uma grande honra.

Tatiana, eu sei pouco sobre sua vida. As feministas, o movimento negro e os partidos de esquerda não vão procurar detalhes sobre a história de sua vida, sua família, seus filhos, seus amigos, seus colegas de trabalho. Ninguém vai se lembrar da sua infância, dos seus sonhos, do dia em que você entrou na academia de polícia. Ninguém vai estampar o seu rosto numa camiseta ou numa faixa. Ninguém vai gritar que a sua morte é culpa dos fascistas, dos racistas, dos bolsonaristas. Em torno de você e das circunstâncias de sua morte, vai haver uma grande muralha de silêncio. Seu assassinato não vai figurar no rol dos crimes do “genocídio negro”. Em forma de número, você entrará para as estatísticas de uma das polícias que mais morre no mundo. E só.

Mas eu canto a sua vida, Tatiana. Canto a sua vida que não cabe nas narrativas do PT e do PSOL; a sua vida que não tem lugar nos protestos nem nas invasões; a sua vida que não favorece a candidatura de bandidos nem o poder de bandidólatras; a sua vida que não sobe hashtags nem vai virar seriado; a sua vida cujo sentido era defender outras vidas; a sua vida de mulher, de mãe, de trabalhadora; a sua vida que não dá manchete; a sua vida tão curta; a sua vida tão simples; o templo da sua vida eterna.

Eu canto sua vida, soldado Tatiana, vítima do mal que habita o coração humano e do silêncio que esvazia as almas e cria não-pessoas.

― Paulo Briguet é escritor e editor-chefe do BSM. Crônica inspirada em um vídeo de Paulo Kogos.

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