Um milagre chamado Lucas

O Lucas sempre foi um menino abençoado, desde o seu nascimento milagroso (que testemunharei em um segundo artigo). Porém, ninguém poderia imaginar que o pequeno menino de três anos iria passar por mais uma grande provação e, novamente pela Graça de Nosso Senhor Jesus Cristo e pela intercessão de Nossa Senhora, receberíamos um grande e portentoso milagre.

Lucas na época do acidente então com três anos: seu sonho sempre foi ser médico para cuidar de crianças doentes.

No dia 10 agosto de de 2018 eu deveria participar de uma reunião no meu trabalho pela manhã, porém, eu avisei por meio de um colega que não iria comparecer pois tinha que cuidar dos meus filhos (o meu filho Pedro de 8 anos estava febril e decidi ficar em casa para levá-lo ao médico caso fosse necessário). Essa intuição, que para mim foi ação da Divina Providência, foi fundamental para tudo o que viria acontecer.

Como tínhamos uma família grande, com 4 filhos à época (hoje temos 5), nós contratamos uma babá para nos ajudar com as crianças, principalmente com o de 3 anos, Lucas, que era um menino alegre, feliz e agitado, sempre buscando brincar e se aventurar dentro e fora da casa. Moramos em uma casa que tem piscina e por isso, assim que mudamos, mandei fazer uma cerca com grade de mais de um metro e quarenta de altura com um portão com cadeado, além de uma capa de proteção. Contudo, naquela sexta feira a capa da piscina estava na lateral devido aos piscineiros terem feito a manutenção, ou seja, jogaram os produtos de limpeza para deixarem agir para no dia seguinte limparem. Com isso a piscina estava sem capa e com bastante sujeira no fundo. Nós não sabíamos mas havia um brinquedo na parte funda da piscina, que não havia sido retirado, e que com a capa aberta era possível enxergá-lo pelo lado de fora da cerca.

Aproveitando que a minha sogra estava em casa, além da minha esposa, empregada e babá, fui ao banheiro tomar banho e aproveitei e pedi para trancarem a porta da sala para que o Lucas não saísse para a frente da casa, onde ficava a piscina.

O ACIDENTE

Enquanto estava no banheiro pude ouvir uma voz de criança que parecia passar pelo corredor, ao lado da janela do banheiro, que dava para frente da casa. Na hora não me atentei que poderia ser o Lucas, já que a porta da sala estava fechada e que para acessar esse corredor ele teria que sair pela área de serviço, passando por todo mundo, ir por trás da casa para depois sair pelo corredor do canil, que tem um portão que fica geralmente trancado.

Passados alguns minutos ouvi um grito de desespero da minha esposa, o que me fez sair de imediato e ir direto para fora da casa. As pessoas da casa gritavam que o Lucas havia caído na piscina, o que naquele momento me parecia impossível pois ele era muito pequenininho e jamais conseguiria (pelo menos na minha cabeça) pular a cerca da piscina, coisa que nem os mais velhos e muito mais altos jamais conseguiram, contudo, ao correr em direção dos gritos vi uma cadeira pesada de aço que estava ao lado da grade. Era uma cadeira de festa que foi alugada para um evento na casa e aguardava recolhimento, junto com as demais cadeiras e mesas pela empresa. O mistério estava resolvido, o Lucas havia empurrado a cadeira da varanda da casa até a cerca e pulou por cima dela. Ele havia visto o brinquedo no fundo da piscina e resolveu ir buscar, para isso anda teve o cuidado de tirar a roupa e deixar ao lado da cadeira. Usei a mesma cadeira para pular por cima da cerca e cair dentro da água.

A cena que se seguiu é o pesadelo de qualquer pai ou mãe da face da terra, a minha esposa retirou o nosso filhinho, a quem sempre chamamos de Luquinhas, do fundo da piscina e, em desespero, o entregou nos meus braços, indo, chorando para o gramado na lateral da piscina onde ficou deitada.

Ao olhar para aquele menino pequenino pude ver o quão grave era a situação, pois como trabalho na polícia militar há mais de vinte anos, puder ver os sinais do estado geral dele: Estava com as pupilas dilatadas, lábios arroxeados, sem pulso e com o diafragma dilatado. Não estava respirando e eu não conseguia sentir nenhum batimento cardíaco. Naquele momento de profundo desespero gritei a plenos pulmões:

Jesus Me ajude!

Imediatamente voltei a raciocinar e fui a borda da piscina e, depois de colocá-lo na beirada, iniciei as manobras de ressuscitação cardiopulmonar. Como ele tinha tomado café da manhã há pouco tempo tive que virá-lo de lado para que saísse, além da água dos pulmões, o alimento que estava no estômago. Foram minutos intermináveis até que o nosso vizinho, o Coronel do Corpo de Bombeiros Jorge, juntamente com a sua esposa, ouvindo os gritos de desespero que vinham da nossa casa correram em auxílio. O Jorge pulou na piscina comigo e de imediato passei o Lucas para ele, que continuou a manobra de massagem cardíaca e a insuflação pulmonar.

Saí da piscina e corri para pegar a chave do meu carro enquanto o Jorge fazia o que podia manter o oxigênio entrando nos pulmões do Lucas. Assim que dei partida falei para o Jorge entrar pelo banco de trás, ele argumentou que era melhor esperar pois ele tinha chamado apoio de resgate de ambulância dos bombeiros, eu retruquei que tínhamos que ir logo. Ele concordou e entrou. Olhei no relógio do painel e eram exatamente 10 horas da manhã.

Desci a toda velocidade em direção ao balão de acesso da cidade de Arniqueira onde moramos. Rezava o tempo todo em voz alta pedindo a Deus e a intercessão de Nossa Senhora. Eu podia acompanhar pelo retrovisor interno do carro que o Jorge continuava a manobrar o peito do Lucas até que, no momento em que contornei o balão, ele parou. Eu perguntei na hora:

– Jorge o que houve?

Ele me respondeu:

– Ele voltou a respirar.

Eu, sem acreditar, disse:

-Não mente pra mim!

Jorge respondeu:

Se não acredita sobe os vidros do carro!

Nesse momento fechei os vidros do carro e pude ouvir claramente a respiração pesada e rouca do pequeno Lucas. Entre lágrimas e orações e súplicas me concentrei na direção do carro para o hospital. Rezava Ave Maria em sequência, além de suplicar pela intercessão de Nossa Senhora.

Tomei a decisão de ir direto ao Hospital Santa Lúcia no final da Asa Sul. Como era horário ainda de trânsito pesado fui na faixa de ônibus. Não me lembro da velocidade mas fui o mais rápido que o carro conseguia desenvolver. Furei todos os pardais* desde a pista do ParkWay até a frente do hospital, além de passar em todos os sinais vermelhos.

Ao chegarmos à emergência descemos gritando “afogamento” e fomos direto para a ala pediátrica que fica direita da emergência geral. Fomos recebidos por dois médicos e comecei a relatar o acontecido. Nesse momento todos que estavam de serviço e nas dependências do hospital tinham os olhos e os corações fixos naquele pequeno menino, que agora tinha um ambu de respiração manual sendo apertado em seu rosto. Depois de alguns instantes os médicos decidiram subir com ele direto para a UTI infantil. Nesse momento não vi mais o Jorge, que ficou sentado, descalço, e desolado nas cadeiras de atendimento da emergência. Só voltaríamos a nos ver 3 dias depois.

Ao entrar na UTI médicos e enfermeiras começaram o procedimento de sedação e intubação, que é um processo doloroso de assistir, uma médica pediu que eu esperasse no corredor.

Ainda atordoado, molhado e com a cabeça girando lembrei de ligar para a minha esposa. Ao ligar quem atendeu foi a esposa do Jorge, a minha mulher com medo de receber uma notícia terrível, passou o telefone para ela. Eu, quase sem voz disse:

Ele está vivo!

A minha vizinha, esposa do Jorge, começou a gritar e a louvar a Deus e passou o telefone para a Kelly minha esposa. Chorando muito conseguimos conversar e contei a ela que ele estava respirando e chegou vivo ao hospital. Ela ainda me perguntou:

-Aonde você está?

Respondi:

-No hospital.

Ela ainda me perguntou:

-Ele está na emergência?

Respondi que não, que ele já tinha sido atendido na emergência e agora estava UTI pediátrica. Perguntei o porquê dela estar questionando isso e ela respondeu:

-Foi muito rápido que vocês chegaram aí, a ambulância dos bombeiros acabou de chegar aqui em casa…

TRÊS DIAS DE TREVAS E DE ESPERANÇA

Primeiro dia – sexta-feira – 10 de agosto

Entrada da UTI Pediátrica do Hospital Santa Lúcia.

Logo após a ligação fiquei sentado do lado de fora da UTI Pediátrica em uma das cadeiras de espera. Em frente havia um pequeno altar com imagens de Nossa Senhora, Santos, terços, orações e um bíblia. Ao lado um quadro grande com desenhos dos pequeninos e das famílias dando testemunho da cura e recuperação das suas crianças. Essa imagem do pequeno altar e do mural me deram muita força e esperança. Orava mesmo em estado de choque pelo que estava acontecendo.

Em seguida minha esposa chegou ao hospital e foi direto a UTI. Como o Lucas estava na guarda dela e da babá imaginei que ela poderia carregar algum sentimento de culpa pelo acidente, por isso, assim que ela chegou eu a abracei e, buscando consolá-la, disse que a culpa não era dela e que acidentes, infelizmente, acontecem. Ela se acalmou e sentamos juntos nas cadeiras no corredor.

Como eu estava ainda de short e camiseta e todo molhado de piscina pedi a ela que ficasse no hospital para que eu pudesse ir em casa tomar um banho e trocar de roupa. Ela concordou e fui o mais rápido possível para casa. Chegando lá a primeira coisa que vi foram as pequenas sandálias do Lucas ao lado da porta e, depois, no quarto a sua caminha ao lado da nossa, pois como ele era ainda muito pequeno, dormia conosco em uma cama em formato de carrinho. Com o coração pesado tomei banho, fiz a barba, peguei o meu terço e voltei o mais rápido possível para o hospital. Ao chegar pedi a minha esposa que voltasse pra casa e cuidasse dos nossos outros três filhos, a mais nova Maria Clara, não tinha um ano de idade ainda. Disse a ela para rezar e confiar em Deus.

Depois que ela saiu comuniquei ao Padre da nossa Capela, Nossa Senhora das Dores, o que havia ocorrido e ele foi imediatamente ao hospital. Quando vi o Padre Daniel Pinheiro senti um grande alívio no coração e, depois que ele fez a unção no pequeno Lucas pude sentir mais confiança e conforto, pois sabia que para o nosso grande e poderoso Deus nada é impossível e que, pela intercessão de Nossa Senhora, Nosso Senhor Jesus Cristo sempre havia nos ajudado e abençoado antes. Decidi que ficaria aos pés do meu filho em jejum, em vigília e oração, rezando o Rosário, durante todo o tempo em que o Lucas estivesse entre a vida e a morte intubado. Fiz esse voto olhando para o pequeno, que ainda estava meio molhado de piscina, pois devido alto risco neurológico por conta do longo tempo em que o cérebro ficou sem oxigênio, era necessário que mexessem nele o mínimo possível.

Nesse dia conheci a Médica Chefe da UTI Pediátrica a Dra Vera Meister, um verdadeiro anjo em todo esse calvário. Ela acompanhou o Lucas do primeiro ao último dia no hospital sempre buscando nos mostrar a real situação sem perder o calor humano e a empatia, tão caras nesses momentos de profunda dor e sofrimento.

À tarde o Dr Jorge Afiune, o cardiopediatra que cuidou dele durante o problema cardíaco do Lucas no nascimento dele, veio ao hospital. Era sua preocupação e a nossa que o coraçãozinho dele poderia ter sofrido alguma lesão durante todo o acidente, principalmente nas manobras de ressuscitação cardiorrespiratória onde tivemos que pressionar o peito. Nunca vou me esquecer da expressão desse grande médico passando a mão na cabeça do Lucas e com lágrimas nos olhos enquanto fazia uma ecografia do coração dele. Pela graça de Deus o coração estava ótimo e estava funcionando bem.

O dia foi chegando ao fim e a noite caiu sobre Brasília. Eu estava na poltrona de acompanhante ao lado do Lucas e, de jejum, havia rezado o Rosário completo. Durante a madrugada, quando os médicos vão repousar e está tudo calmo na UTI, me recostei na poltrona. Uma das enfermeiras havia dito para eu descansar um pouco pois o dia tinha sido pesado. Acredito que eram umas três horas da manhã quando acordei com um grande susto. Todas as máquinas e monitores conectados ao menino estavam disparados os alarmes, fazendo um grande barulho, e ele estava convulsionando, em um movimento de reflexo tentando tirar o tubo de respiração. Com muita dificuldade e com ajuda das enfermeiras e medicas conseguimos segurar ele, porém, para estabiliza-lo novamente, tiveram que trabalhar por muito tempo e me pediram para esperar do lado de fora, no corredor.

Segundo dia – sábado- 11 de agosto

Já havia raiado o dia quando a médica do plantão da noite me disse que ele estava estável e que haviam controlado o quadro. Foi um grande alívio. Entendi no meu coração que, talvez, nessa batalha pela vida do Lucas houvesse algo a mais do que somente os fatores físicos do acidente, por isso jurei a mim mesmo que não mais dormiria, além de manter o jejum a somente a pão e água (pão somente pela manhã com um pequena xícara de café), além de rezar o Santo Rosário e intensificar as orações pedindo também a intercessão de São Lucas, Santo Padroeiro dos Médicos e de São Pio de Pietrecilna, o nosso Santo de devoção da família.

Durante a manhã o meu pai, avô do Lucas, Paulo Afonso, veio nos visitar. Ele foi o único, além de mim e da minha esposa que teve forças para ver o nosso pequeno naquela situação. Conversou comigo e juntos descemos ao pequeno café que fica perto da emergência do hospital para conversar e ver a minha irmã Carolina que já estava nos esperando.

Desde o acidente começamos a pedir orações, para sacerdotes, amigos e colegas, que por sua vez, pediram a outras pessoas e assim por diante. Eu podia sentir as orações e clamores das pessoas a Deus e o conforto e confiança que foram crescendo a cada momento.

A tarde um médico muito bom, neuropediatra, veio ver o Lucas. Depois de examiná-lo com toda atenção ele me chamou para conversar no corredor. Com um rosto sério me disse que o quadro do menino era muito grave e que, dependendo do período de tempo que ele ficou sem oxigenação no cérebro, seria difícil ele sair daquela situação e se saísse ele poderia ter sequelas graves para o resto da vida. Ouvi cada palavra daquele médico, que eu sabia que estava fazendo o melhor que podia pelo Lucas, mas coloquei toda aquela situação nas mãos de Deus e pedi a Nossa Senhora que intercedesse pelo nosso filho.

Nessa noite recebi a visita de várias pessoas, amigos e colegas da Polícia Militar do DF, que vieram me dar o seu suporte e carinho nesse momento tão difícil. Jamais esquecerei desses amigos que tiveram essa caridade conosco.

De madrugada, por volta de umas três horas da manhã, eu estava de vigília em pé ao lado da caminha dele, rezando e pedindo a Deus pela sua vida. Já havia rezado o Rosário, creio eu mais de uma vez, quando, novamente, todos os alarmes tocaram de novo e o Lucas tentou extubar do mesmo jeito que havia acontecido na primeira noite, só que desta vez, por estar acordado e ao lado da cama, segurei as mãos dele com força e de maneira rápida evitando assim que ele entrasse na situação do dia anterior. Chamei a enfermeira e a médica e com algum trabalho, conseguiram estabilizá-lo. Graças a Deus ele estava estável e a situação terminou em poucos minutos. Foi nesse momento que tive a certeza que havia uma batalha pela vida dele e era também espiritual.

Terceiro dia – domingo – 12 de agosto

O domingo seguiu como nos outros dias, com reuniões com médicos, exames e medicamentos. Aproveitei para ir em casa tomar banho, fazer a barba e trocar de roupa. Fiz isso depois do almoço, que era um período relativamente mais calmo da rotina no hospital. Pude também ver os meus outros filhos, Davi de 12 anos, Pedro de 8 e a Maria Clara de um aninho.

Ao retornar ao hospital, já pelo o final da tarde, encontrei a minha esposa, a Dra. Vera e os demais profissionais da UTI muito tensos. O Lucas estava com uma febre muito alta de quase quarenta graus, devido a uma forte pneumonia causada pela aspiração da água suja da piscina. O neuropediatra havia solicitado ao pessoal da UTI pediátrica que não permitissem que febre dele subisse muito, devido ao risco neurológico que ele tinha. Todos estavam preocupados e mesmo com medicação e lençóis molhados a febre não cedia. Trouxeram então um ar-condicionado móvel de centro cirúrgico e abaixaram a temperatura geral da UTI, porém nada estafa fazendo efeito e a febre continuava.

Nesse momento senti que era hora de ir a Missa e pedir diretamente na Casa de Deus pela vida do Lucas e para que essa febre cedesse. Expliquei a minha esposa o que eu iria fazer. Ela me abençoou e ficou com acompanhando o menino enquanto fui direto a Capela Nossa Senhora das Dores que fica no Jardim Botânico. Lá pude assistir a Missa e comungar pedindo com toda a minha fé por essas graças. Após a Missa pude conversar com os Padres e pedi orações. Eles já estavam rezando pois o Padre Daniel Pinheiro havia pedido a todos os fiéis e padres que rezassem por ele. Ficou acertado que no dia seguinte, segunda-feira, um Padre iria ao hospital para abençoar o Lucas. Muitos fiéis da Capela vieram falar comigo e contaram que estavam rezando muito pelo nosso pequeno. Não me recordo se foi nesse momento, mas fiz uma promessa de ir ao Santuário de Nossa Senhora Aparecida pela cura dele.

Ao retornar ao hospital fui direto à UTI onde a minha esposa, sorrindo, veio me abraçar e dizer que a febre havia baixado e ele estava bem. Agradeci muito a Deus e segui com as orações do Santo Rosário. Minha esposa rezou um Mistério comigo e, depois de abençoar o Lucas, voltou para casa para cuidar dos outros filhos. Passei mais uma noite em claro, em jejum e oração. As vezes, durante a noite, quando estávamos só eu ele, pois todos dormiam, eu passava as mãos nos seus cabelos e o abençoava fazendo o sinal da cruz em sua testa. As vezes eu beijava a sua mãozinha conectada com o soro e sensores das máquinas médicas, que com os seus sons de bipes eletrônicos eram os únicos sons naquela noite escura.

Durante todos esses dias de grande sofrimento e dificuldade centenas de pessoas, parentes, amigos e desconhecidos, rezaram pelo nosso pequeno Lucas. Eu quase podia sentir a oração das pessoas e a intercessão de Nossa Senhora nessas horas. Com essa esperança em Deus fiz o que me cabia: Orar e confiar.

Centenas de pessoas rezaram pelo Lucas. Em especial o Grupo de Oração Santa Bárbara da Paróquia Maria Auxiliadora em Arniqueira por meio da Sra. Ângela.

A ressureição – segunda-feira – 13 de agosto

O dia começou com grande expectativa, pois era o dia em que o Lucas faria uma tomografia computadorizada do cérebro para, estando tudo bem, fazer o procedimento de extubação à tarde. Era ainda de manhã quando a equipe médica iniciou os procedimentos para transportar o pequeno para a sala de tomografia, que ficava dois andares abaixo da UTI pediátrica.

Após os procedimentos, pois o Lucas continuava intubado, ele foi transportado com todos os sensores e aparelhos até a porta do elevador. Porém, ao chegarmos a porta do elevador, a médica deu-se conta que a maca e os aparelhos, principalmente o respirador automático, não entravam pela porta. Após alguma hesitação a médica optou por desconectar a máquina de respiração e usar um respirador manual chamado ambu. Eu, nesse momento, não tive reação pois, para mim, deveria ser um procedimento usual e que médica teria controle dos sinais vitais dele, mesmo com a pesada sedação. Logo isso se mostraria um erro grave.

Após descer e fazer a tomografia vi um movimento estranho na sala e dos médicos. Imediatamente levaram o Lucas de volta para UTI pois ele estava pálido e com baixa saturação. Obviamente que o ambu não foi suficiente para manter a respiração dele e que agora estávamos em um corrida contra o relógio para conectá-lo a máquina e restaurar os seus sinais vitais.

Passados alguns momentos de apreensão a Dra chefe da UTI deu-nos a notícia, devido ao procedimento o Lucas teve uma atelectasia, ou seja, o pulmãozinho dele teve um colapso parcial e isso era grave. Quase ao mesmo tempo que recebíamos essa notícia chegaram a UTI o Padre Marcos da Capela Nossa Senhora das Dores com um rapaz postulante, que por coincidência antes de decidir pelo sacerdócio era aluno de medicina.

Explicamos rapidamente a gravidade do quadro ao Padre Marcos, que imediatamente se paramentou e iniciou a unção dos enfermos nele. Todos acompanhamos emocionados enquanto o Padre, com toda a devoção, ungiu a testa do Lucas com o santo óleo e fez as orações em latim. Terminada a unção pedimos a ele orações pelo nosso menino e decidi acompanhar o Padre e o Postulante até o estacionamento interno onde estava o carro deles. Após me despedir e agradecer voltei o mais rápido possível para a UTI.

Ao chegar de volta fui recebido com a notícia que o pulmão havia aberto e que agora iriam iniciar o procedimento de tirá-lo do coma induzido. “Mais um milagre de Deus!” pensei enquanto assistia aos enfermeiros, auxiliares de enfermagem e médicos preparando o Lucas para retirada do tubo em dos outros aparelhos.

No cômodo da UTI pediátrica, onde a cama com o Lucas estava, era bem apertado e com cortinas ao invés de paredes, agora estava cheia de médicos, enfermeiros e toda a sorte de profissionais do hospital. Até mesmo o Diretor do Santa Lúcia veio acompanhado da Dra Débora Tessis. Com a presença da Dra Vera Meister, que havia acompanhado o pequeno Lucas desde a sua entrada na UTI foram aos poucos retirando e desligando os equipamentos. Pela primeira vez não fiquei ao lado da cama do meu filho, pois deixei que a minha esposa Kelly ficasse ao seu lado segurando a mãozinha dele. Lembrei do médico neurologista me explicando que ele poderia ter sérias sequelas, como não reconhecer a família e perder a capacidade de fala por exemplo. Mais uma vez segurando o Santo Terço e rezando acompanhei quando depois de três longos dias o Lucas abriu os olhos. Pude ver que o seu rosto tinha marcas dos tubos ao lado da boca e que parecia olhar para o vazio. A minha esposa o estimulava falando com ele, porém ele não respondia. Passados alguns momentos, com um silêncio absoluto de todos, ele começou a mover os olhos ao redor, parecendo não reconhecer ninguém. Somente se ouvia a minha mulher falando com ele baixinho até que os olhos dele, correndo pela sala, se encontraram com os meus, pois eu estava junto da equipe médica a um metro e meio distância, e de repente ele disse com uma voz clara e alta:

Olha lá o meu pai! Oi papai!!!

Nesse momento todos explodiram de alegria, gritando, louvando a Deus e agradecendo a Ele por esse milagre. Eu, pela primeira vez desde o acidente chorei e deixei sair do fundo do meu coração um louvor misturado as lágrimas, enquanto todos que estavam ao meu redor me abraçavam comemorando a vida do pequeno Lucas. Tentei no meio desse momento ligar para avisar ao avós para dar essa notícia maravilhosa mas o celular passou entre a minha mão, eu tive um pequeno colapso.

A primeira foto tirada do Lucas logo após acordar do coma.
Lucas abraça o seu irmão Pedro pela primeira vez depois do acidente.
Lucas com o seu irmão mais velho Davi no box da UTI.

Passado a alegria começaram a fazer exames e a conversar com o Lucas. Eu queria ficar mas como estava acordado a quase quatro dias e praticamente sem comer a minha esposa e as médicas me mandaram pra casa. Sem poder discutir desci o elevador e fui ao estacionamento pegar o carro. Parecia que eu flutuava pois não conseguia mais pensar direito. Não me lembro como dirigi até a minha casa mas me lembro de chegar e, depois de tomar um banho que lavou a minha alma, pegar o travesseirinho dele e colocar no meu rosto para dormir. Tive um sono pesado e senti como se a minha respiração e coração estivessem descompassados. Acordei quase dez horas depois com um ressaca pesada mas feliz como nunca me senti antes. Assim que levantei conversei com os meus filhos Davi e Pedro e voltei ao hospital.

Jesus Cristo é lindo e ele voa

Passado algum tempo, eu ainda me acostumava com o menino que durante tanto tempo ficava deitado sem se mover agora estava recuperado e, como todo menino saudável, conversava e se mexia o tempo todo. As pessoas haviam retornado ao seus afazeres e ficamos somente eu e ele de novo no box da UTI pediátrica. Foi então que uma psicóloga do hospital veio conversar comigo e com a minha mulher.

Ela nos explicou que devido ao fato dele ser muito pequenininho, com apenas três anos, deveríamos ter alguns cuidados com ele na hora de explicar o que ele estava fazendo ali na UTI. Primeiro ela disse que devido ao tamanho dele ele não teria memória do acidente e que por isso deveríamos evitar de falar do fato até que ele estivesse maiorzinho, pois isso poderia gerar uma trauma nele. Segundo que ele pela idade não tinha noção de certo e errado e que por isso deveríamos evitar de culpá-lo do que aconteceu. Por último ela falou que devido a pouca idade ele também não compreende o conceito de morte ou quase morte e que deveríamos não tocar nesse assunto com ele. Entendemos e concordamos.

Já havia passado mais um bom tempo e a minha esposa havia ido conversar com a Dra. Vera na ilha de enfermagem que ficava no meio do ala.

Nesse momento o Lucas pediu para ir ao banheiro, como ele estava usando fralda eu disse a ele que fizesse ali mesmo. Ele recusou dizendo “que não era bebê mais para fazer xixi na fralda. Eu entendi o ponto de vista dele e chamei a enfermeira para desconectar os acessos e sensores do corpo dele para que eu pudesse levá-lo ao banheiro. Após a chegada da enfermeira eu expliquei a situação e ela foi taxativa de que não poderia desconectar os acessos de soro e os sensores do menino em hipótese nenhuma pois era necessário uma autorização do corpo médico. Após ela sair eu dei um piscada para Lucas. Qual não foi a surpresa quando a enfermeira, as médicas e a minha esposa tiveram quando viram eu e o Lucas passando em frente a ilha de enfermagem caminhando calmamente para o banheiro, eu havia desconectado os sensores e levava na mão o soro que ainda estava no acesso do braço dele.

Ao chegar ao banheiro eu tirei a fralda dele e fiquei aguardando enquanto ele esvaziava a sua bexiga. Nesse momento ele se virou para mim e perguntou:

– Pai eu tenho que aprender a nadar.

– Por quê meu filho? Eu respondi.

– Por que eu me afoguei na piscina. Eu desobedeci e entrei na piscina e me afoguei.

Ao meu lado já estava a minha esposa e a enfermeira que, assim como eu, ficaram com os olhos marejados.

Após ele terminar levei ele de volta a cama e ao se sentar ele começou a contar sobre o acidente.

– Eu me afoguei e quase morri. Disse ele.

– Meu filho não diga isso, você não sabe o que é morrer. Disse a minha esposa.

– Claro que sei mamãe! Morrer é ir para o Céu como aconteceu com o meu avô. Respondeu ele.

Nesse momento todos começamos a chorar e enquanto tentávamos consolá-lo ele disse:

– Não chore mamãe. Eu não morri porque Deus me salvou.

E ainda disse com os olhos brilhando e com o rosto com um sorriso de pura felicidade:

– Jesus é lindo e ele voa!

Um novo aniversário

Equipe da UTI Pediátrica do Hospital no momento da transferência dele para o quarto normal.

Após muitos exames e sessões de fisioterapia finalmente o pequeno Lucas iria para o quarto normal, saindo da UTI, para ficar poucos dias em observação e, pela Graça de Deus, ter alta e ir finalmente para casa.

No hora de sair da UTI nos despedimos da equipe médica, que foram todos eles anjos de Deus nesses momentos. Depois a minha esposa sentou em uma cadeira de rodas e colocou o Lucas no colo para que pudéssemos ir para a ala dos quartos infantis de internação que ficava em outro andar e em outro bloco do hospital. Foi um grande alívio e alegria quando saímos da UTI rumo ao quarto, mas ao mesmo tempo, ficamos emocionados com o carinho e alegria das enfermeiras, técnicas e das médicas conosco. Não tínhamos palavras para agradecer.

Salmo 99: Estava a Bíblia aberta nesse salmo no dia em que o Lucas acordou sem sequelas. Louvado seja Deus Todo Poderoso pela sua infinita Misericórdia.

Após chegarmos no quarto pudemos deixar que os avós e os irmãos passassem mais tempo com o Lucas no quarto, o que ele achou o máximo pois sempre foi um menino carinhoso e amoroso com a família.

Lucas com o seu irmão Davi já na cama do quarto normal.

Um momento de grande emoção foi quando o Coronel Jorge do Corpo de Bombeiros do DF veio visitá-lo. Ele não o via desde o dia do acidente. Depois soubemos que naquele dia fatídico era o último dia dele na ativa e por estar indo para reserva depois de 30 anos de carreira ele seria homenageado a tarde na sede da corporação. A alegria no rosto do Lucas ao ver o grande herói do seu salvamento entrando no quarto foi inesquecível.

Coronel Jorge do Corpo de Bombeiros do DF foi o grande herói do salvamento do Lucas no dia do acidente.
Lucas abraça o Jorge agradecendo por ter salvo a sua vida.

Depois recebemos a visita da Dra Vera que tanto trabalhou pela vida do Lucas. Em nome dela agradecemos a cada médico, a cada enfermeira e técnica, a cada funcionário do hospital que trabalhou e rezou pelo Lucas.

Lucas com a Dra Vera Meister.
Dra. Vera com Lucas e a família.

Por fim recebemos um visita muito especial: O Padre Daniel Pinheiro. Ele que foi uma das primeiras pessoas a ver o Lucas intubado e que tanto rezou e buscou a benção de Deus. A ele, como Sacerdote do Deus Altíssimo, agrademos a Deus, Nosso Senhor Jesus Cristo e a Nossa Mãe Maria Santíssima por esse grande e portentoso milagre.

Lucas com o Padre Daniel Pinheiro.

No dia seguinte recebemos uma grande surpresa: a equipe do hospital preparou uma festa para comemorar a vida e milagre do Lucas. Era uma festa belíssima com doces, salgadinhos, presentes e como não poderia deixar de ter, um bolo. Chamamos os avós e comemoramos com os pais e as crianças que estavam internadas uma festa impossível de não se emocionar.

Festa no corredor do hospital no andar infantil preparada com todo amor e carinho pela equipe do hospital.
Lucas com os avós: Vovô Paulo, Vovó Sandra e Vovó Zilda.

Alta e volta para casa

Mamãe Kelly com o Lucas no dia da alta.

Após quase sete dias do acidente finalmente chegou o momento da tão esperada alta do Lucas. Agora ele poderia ir para casa e se reunir com a família depois dessa grande provação, pela total e absoluta Graça de Deus, são e salvo.

A primeira data comemorativa que passamos juntos depois de tudo foi o aniversário da nossa filha Maria Clara, irmã mais nova na época, que estava comemorando um aninho poucos dias após a alta do Lucas.

Lucas com os pais, irmãos e a irmã mais nova no seu aniversário de um ano.

Outro momento muito bonito foi a homenagem que os meus colegas da Polícia Militar do DF fizeram para o Lucas no quartel que eu trabalhava. Muitos irmãos de farda não só rezaram pela vida e saúde do Lucas como tiveram a bela caridade de ir ao hospital para dar força e solidariedade. Não só os policiais mas todas as pessoas que rezaram e nos visitaram naqueles dias tão difíceis eu jamais esquecerei e peço a Deus e a Nossa Senhora Maria Santíssima que abençoe a cada um com as graças de Deus.

Lucas no meu colo enquanto era homenageado pelos meus colegas de farda.
Lucas recebe de presente uma carro de polícia militar. Ao lado o Coronel Reginaldo então Chefe da Segunda Seção do Estado Maior, local onde eu servia à época.

Outra data marcante, obviamente, foi o nosso primeiro natal pós acidente, onde aproveitamos para agradecer a Deus, na Pessoa de Nosso Senhor Jesus Cristo, por este grande milagre chamado Lucas.

A família reunida no Natal de Nosso Senhor Jesus Cristo.

Ao final de tudo só posso louvar a Deus pela sua infinita misericórdia conosco por permitir que tenhamos a companhia do nosso milagre chamado LUCAS!

Que Deus seja louvado!

Salve Maria Santíssima e todos os Santos e Anjos que intercederam por nós nesse grave momento,

“Afinal, tudo concorre para o bem daqueles que amam a Deus…”

Rm 8,28

Olavo Mendonça.

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